Levitava pelo banco do carro, leve e feliz, o som de mpb
deixava o verde mais vivo, o sol menos quente, o vento mais gostoso, usava um
óculos escuro de formato quadrado, sua pele branca era lisa e fina, de detalhes
fortes, uma tatuagem de fogo no braço que se destacava, olhava a paisagem que
corria pelo seu olho, sentia o vendo e banhava-se em memórias, ao seu lado
estava um dos tantos tios, aumentou o volume, e por duas ou três horas
continuou a ouvir musicas calmas e renovadoras, estava vivo, estava bem.
***
Ao avistar a porteira sabia que chegara na “roça”, um lugar
da família, desceu do carro prata e foi desengonçado abrir a porteira, tirou
com cuidado o arame farpado e arrastou o tronco de madeira de seu caminho, o
carro passou com calma e parou, esperou o jovem de cabelos pretos e lisos,
penteados de forma a espetarem, usava uma blusa preta com detalhe em gola “V”,
uma calça jeans preta e um tênis listrado, “Rock’nRoll” como diziam, entrou no
carro e não colocou o cinto de segurança, logo outra porteira pela estrada
torta e avermelhada, saiu do carro e abriu, dessa vez o carro não o esperou,
chegara ao tão esperado destino, fechou com calma, olhou para a esquerda e viu
o curral, algumas vacas, um cavalo meio perdido, na calmaria do campo, dali
descia um morro longo recheado de verde, muita grama, a frente um caminho de
terra feito pelo tempo, um enorme pé de jabuticaba, uma casa onde ficava um
cachorro e um carro velho, mais a direita vários pés de café.
Seguiu pela estrada de terra, sentindo aquele cheiro
relaxante de comida no fogão a lenha, cheiro de jabuticaba apodrecendo no chão,
cheiro de rosas que estavam jogadas, virou pela estrada seguindo a lateral de
uma casa amarelada, cuja base estava coberta de lodo, levantou o olhar e viu
sua avó que o aguardava com um sorriso escondido, caminhou com calma ignorando o calor de um
sol teimoso, via-se somente a mulher vivida, terra, mais pés de jabuticaba,
arvores altas mais acima e uma enorme montanha, o som predominante era de um
rio que corria por lá.
-Vamos, o almoço está pronto.
A mulher falou com um sotaque carregado, virou novamente e
já viu todos os seus tios sentados, sem camisa, as barrigas grandes de tanta
cerveja, carne na churrasqueira e a cerveja sendo servida sem pudor.
Cumprimentou a todos com sorriso tímido, entrou na casa, meio escura, pois
somente recebia luz natural naquela hora, uma tia estava cozinhando o almoço,
continuou a entrar já sentindo falta da bagunça da cidade, a enorme mesa de
madeira antiga e a foto de um tio que cuidara do lugar por mais de 60 anos,
morrera há pouco, suicidara-se por amor.
Um pouco mais a frente da mesa estava a entrada do banheiro,
do lado uma passagem para um quarto improvisado, outra entrada para outro
quarto, logo mais a sala com TV e da sala outro quarto, ao entrar na sala viu
seus primos assistindo TV, sentou no chão e ali ficou por um tempo até que
alguém interviu, chamando a todos para o almoço, foi ligeiro.
***
Na falta de novidade decidiu deitar um pouco na rede,
balançava pouco vendo o tempo passar, viu o céu que estava um pouco carregado
de nuvens ficar alaranjado pelo sol poente, respirava fundo, sentindo o sono
chegar, todos bebiam e comemoravam suas vitorias na trabalho e na família.
Ouviu alguém chamando seu nome, era seu primo, o chamando
para ir na beira do rio, subiu com dificuldade, estava de short e sentia os
mosquitos picando sem vergonha, sua perna branca estava logo vermelha pelo
incomodo, pisando nas folhas secas foi caminhando e seguindo os que para lá
iam, tentava não demonstrar cansaço e quando estava mais cansado, chegou, o rio
era fino, limpo, viu alguns peixes pequenos nadando tranquilamente, não tinha
barulho nenhum além da água corrente, o sol ainda soltava alguns raios
iluminando alguns feixes de água, abaixou-se e observou vários pontos pretos e
pequenos, sem saber o que era pegou com a mão, estavam envoltos por uma
cobertura gelatinosa, com facilidade destruiu o que parecia uma cobra
transparente, uma mangueira com pontos pretos dentro, perguntou vergonhosamente
o que era aquilo.
-São ovos de sapo! Legal né?
-Sim, muito.
Jogou no rio, a gelatina esquisita logo misturou-se na agua
e na beira do rio ficou, esperando o tempo passar para os girinos nascerem, tal
que o menino da cidade sentiu pesar o corpo, voltou para a casa velha porém
aconchegante e lavou suas mãos, comeu um pouco de carne do churrasco, ouvindo
piadas incompreensíveis de seus tios, entrou dando boa noite, sua cama estava
arrumada em frente a TV, deitou sem pensar no que fazia, não pensava na vida,
não pensava em nada, sem querer fechou os olhos e adormeceu.
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